quinta-feira, 29 de março de 2012

Fim do Mundo

O cachorro cheirar
e lamber os fundos
da gata.

A Arquitetura do Corpo é o Desejo

É quando se emudece
e se eriça e se contempla
e o olho é o tato
e se esperneia
com fino faro
de quem grita
para dentro
em suor pêlo pele
por dentro da carne
segue o riso em apelo
mapeado na mordida dentro da
mordida
da voz digerida
do beijo voraz
que ecoa saindo de si
rumando ao outro
dentro da cadência
calendular
de onde exalam minutos dentro
dos poros
de onde os polos
desenvolvem seus ritos
restauradores nas
mais antigas danças
onde o corpo desenha no espaço
onde a moradia é o ato
o abraço ponte
que eleva ao som
à luz que revela volume
e quebra as barreiras em
um passo
a
passo
que se sabe tridimensional
em razão de sê-lo em Bernini
onde a composição é dinâmica
e corrobora com as mãos
tão perfumadas com
encantos e sonhos melodiosos
onde o intervalo entre as notas
dura por toda a execução da obra
é quando se uiva e se abala
é quando se canta com a voz do delírio
mais roto e suave
como um recorte de arrebol
quando se beija no escuro
é quando se arquiteta em desejo febril
de alucinada contemplação
pró
ativa
no instante onde se demarca
com os olhos o escorço que
se alimenta das palavras
em tons de pele
ou ainda
em sinfonia
com teus cílios
em contraponto
com tuas ancas
e carregado com tuas visões
acumuladas no espelho
com uma delicada luz pontual
onde revelo e amplio
o que miro
com este olhar que me cabe
e onde me entorto
e suspiro
enquanto morremos de mansinho
enquanto tuas unhas marcam o relevo
calamos em cumplicidade
enquanto espermeio.
A Arquitetura do Corpo é o Desejo.

quarta-feira, 28 de março de 2012

Dístico aos Idos de Março

Temer o futuro não pela ampulheta quebrada,
mas pelas mãos que estancam o tempo presente.

quinta-feira, 22 de março de 2012

Postulado Interdisciplinar I

- Qual o nome do dinossauro Cubista?!

- Braqueossauro!

quarta-feira, 14 de março de 2012

E ainda mais será quando for depois

Olha,

o relógio
também

mastiga parafusos
quando esfomeia

eu mastigo o tempo

e ainda assim,

presumo muita coisa
e
desfaço muito mais
em um

mil
ésimo
de estalo de consciência.

Falta vinho.

Mas vai chover,

água e vinho,

o vinagre

cairá na boca dos poucos - quase muitos - que
odiamos.


Te dou

esta maçã
depois um miojo

e te abraço e penso

nas tintas que uso

e na bagunça
que faço nos discos e nos cílios


que sempre
caem

nos meus olhos



e por
segundos penso em

arrancá-los,
depois,

vejo

que sem eles não dormiria.

Azul

laca amarelo verde

observa

eu tô escrevendo


sobre


amor

esse que nos prepara a cama

sonda o mundo

e arremata sonhos
aos travesseiros nossos



carinhos
para as nossas carnes

vinhos licores
mais líquidos que a ideia de gozar...

te
esperneio


como quem
nada

mergulha


e levita

numa orgia
entre água e corpo



e respinga
atravessa a borda,



escoa e recomeça o ir e o vir,

me ouve,

o teu lápis desliza macio no papel,
eu te ouço


acarinhando o papel com teu soprar
leve e delicado,

vejo teus lábios

se movem
devagar,

assim mesmo,
me seduzindo

como


posso ver
teus olhos

ao passar

a vista


por aqui,

nessa


e nesta

palavra

cheia de bits e bytes

todavia
- nem toda via -,

eu suponho teu canto de boca

naquele

pré-sorriso

lindo e
que tu


o completa de
forma

indescritível...

ainda bem que

posso vê-la
meu Amor,

e assim desejo
e a desejo;

séculos,

noites

polares,

Bosch visto ao vivo,
Baviera - quando o teletrasporte for liberado


cerveja em chuva,

além

do Amor que
temos
e lambemos

os dedos

e os
beiços

enconstados numa árvore


com uma

manguita
sem fiapos


entre as mãos,

e ainda mais será quando for depois.


pois
é
de Amor.

Ode ao Dous de Julho

Era dous de julho. A pugna imensa
Travara-se nos cerros da Bahia...
O anjo da morte pálido cosia
Uma vasta mortalha em Pirajá.
"Neste lençol tão largo, tão extenso,
"Como um pedaço roto do infinito...
O mundo perguntava erguendo um grito:
"qual dos gigantes morto rolará?!..."

Debrudos do céu... a noite e os astros
Seguiam da peleja o incerto fado...
Era a tocha - o fuzil avermelhado!
Era o Circo de Roma - o vasto chão!
Por palmas - o troar da artilharia!
Por feras - os canhões negros rugiam!
Por atletas - dous povos se batiam!
Enorme anfiteatro - era a amplidão!

Não! Não eram dous povos, que abalavam
Naquele instante o solo ensanguentado...
Era o porvir - em frente ao passado,
A Liberdade - em frente à Escravidão,
Era a luta das águias - e do abutre,
A revolta do pulso - contra os ferros,
O pugilato da razão - com os erros,
O duelo da treva - e do clarão!...

No entanto a luta recrescia indômita...
As bandeiras- como águias eriçadas -
Se abismavam com as asas desdobradas
Na selva escura da fumaça atroz...
Tonto do espanto, cego de metralha,
O arcanjo do triunfo vacilava...
E a glória desgrenhada acalentava
O cadáver sangrento dos heróis!...

....................................................................
....................................................................

Mas quando a branca estrela matutina
Surgiu do espaço... e as brisas forasteiras
No verde leque das gentis palmeiras
Foram cantar os hinos do arrebol,
Lá do campo deserto da batalha
Uma voz se elevou clara e divina:
Eras tu - Liberdade peregrina!
Esposa do porvir - noiva do sol!...

Eras tu, com os dedos ensopados
No sangue dos avós mortos na guerra,
Livre sagravas a Colúmbia terra,
Sagravas livre a nova geração!
Tu que erguias, subida na pirâmide,
Formada pelos mortos de Cabrito,
Um pedaço de gládio - no infinito...
Um trapo de bandeira - n'amplidão...

Castro Alves
S. Paulo julho de 1868

***

Lembrete ao 14 de março

Lembrai-vos;
O poema abrirá sua cabeça nem que seja com um machado.

Mais um ano e o poema
anda ralo como caldo de bila
e assina cheques em branco
a cada nova eleição.

Sempre a mesma ladainha
e o poema convencido
que é Sísifo, rola sempre
ladeira abaixo,
e quem dá a mão,
o empurra novamente
dado o término das eleições.

O poema vive num recanto bucólico
da cidade, onde o ar é arejado
e as garrafas servem de bóias
num rio poluído com árvores frondosas,
podadas sem esmero e sem preparo
por homens que servem a tirania
das hidrelétricas e ainda maltratam os gatos.

O poema não foi instruido, ele, nem desenha o nome.
Não pode ir ao hospital muito menos
pensar em Estética... o poema come pão de ontem.

Dorme junto aos ratos - os memos que singraram o atlântico
é mordido por cobras e televisores e ainda se emaranha pela cidade,
na busca interminável por víveres,
que na cabeça do bom-burguês, recicla; e assim, respira mais aliviado quando
arremessa pela janela do automóvel uma latinha de coca-cola...

O poema não dorme e, pensar fica difícil
quando o partido de esquerda e da direita
batem punheta no mesmo pau estatal.

O poema não pede esmola, visto que não é lido.
E ele não é visto, nem lido será lembrado.

O poema tem a pela queimada pelo sol,
anda calado e sozinho, tem ombros
caídos e anda como quem rasteja...

O poema sozinho nada pode.
Não serve para nada - é como o poeta!

A relevância do poema é sua revolta.

Quando o delicado cinzél for enterrado,
e a cruz que marca em x a prudência
desnecessária, arrancado será o medo
do mais recôdito neurônio
e junto aos poemas que erguem casas
sangram por vida em meio ao lixo,
o sangue começará
a espirrar da garganta de quem precisa
perder a cabeça...

Lembrai-vos;
O poema abrirá sua cabeça nem que seja com um machado.

O tempo passará e o punho fechado acenará
com todo o corpo dentro de uma composição
menos harmoniosa dentro do padrão de beleza
europeu-branco-cristão-capitalista.

Hoje não é dia de graça, alegria, ou "poesia".
Poesia concreta é uma tijolada na cabeça do Governador;
uma tijolada na cabeça da Prefeita e da Presidenta
- e venham censurar meu poema!!!
"Cuspo-vos na cara !"
;
Lembrai-vos;
O poema abrirá sua cabeça nem que seja com um machado.

Rafael Carvalho

XIV III MMXII